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O irmão

Era uma vez uma família que consistia numa Mãe solteira e seus numerosos filhos. Sara nunca foi filha única, ela sempre teve um irmão mais velho, Marcos, e apesar de fazer muito tempo ela ainda se lembra de quando era a caçula.
Sara sempre adorou Marcos, ele brincava com ela sempre que podia, sempre que estava por perto. A Mãe sempre esteve muito ocupada, trabalhando ou cuidando dos filhos, quase nunca tinha tempo para ela, nem ao menos para conversar.

Depois de Sara, outras crianças vieram: Lúcia, Joaquim, e o gêmeos Ricardo e Henrique. Marcos era praticamente uma figura paternal para eles, já que nenhum deles tinha pai, e a Mãe se recusava a falar sobre isso.
Conforme ia crescendo, Sara notava que Marcos, de tempos em tempos, desaparecia e voltava. Ele apenas dizia que tinha que cuidar de alguns problemas num lugar distante e nada mais, e sempre que partia parecia muito triste e chateado, mas quando reaparecia, era sempre o Marcos alegre e brincalhão que ela se lembrava. Esse provavelmente era mais um segredo dessa família estranha, outro assunto que a Mãe nunca aceitou conversar.

A Mãe era uma mulher muito rígida e organizada, e talvez por isso nenhum dos filhos jamais teve coragem de desafiá-la ou ao menos questioná-la. Sara supunha que os desaparecimentos de Marcos eram algum tipo de revolta, visto que ele ia embora triste, provavelmente era algo que o incomodava tanto que o fazia ir embora.
Sara sempre se lembrou de Marcos como um irmão muito mais velho que ela, já adulto quando ela era criança. Porém, conforme o tempo foi passando, ele não parecia mais tão velho assim, ele continuava parecendo um jovem adulto, enquanto ela passava da infância para adolescência e muitas transformações ocorriam em sua vida.

Um dia, no auge da rebeldia adolescente, ela resolveu confrontar a Mãe. Marcos tinha sumido novamente há poucos meses, e agora ela já sabia distinguir os sinais: a Mãe estava novamente grávida, carregando mais um filho sem pai, que sobraria para ela, Sara, ajudar a cuidar. Ela ligou os pontos finalmente, todas vez que Marcos desaparecia também coincidia com a data aproximada do nascimento de cada um deles.
Será que ele, por também ser um filho sem pai, se revoltava pela Mãe fazer isso com cada um deles e por isso ia embora? Então, porque ele voltava? Ou melhor, já que ele sempre foi mais velho e sábio, porque nunca a confrontou com aquilo que o incomodava?

Sara fez essas perguntas à Mãe, não com delicadeza, mas com a crueldade de quem se vinga de seu algoz. Eles eram condenados há viver no limiar da pobreza por serem uma família muito numerosa sem ninguém para ajudar. Nunca conheceram um parente, a Mãe nunca teve um amigo. Nenhum deles tivera um pai na vida, nem presente, nem ao menos sabiam um nome ou uma história para explicar essa ausência. Nem um rosto, pois nunca viram a Mãe com nenhum homem, dentro ou fora de casa. Nada.
Sara, por ser a mais velha, tinha que usar seu tempo livre fora da escola para cuidar de seus irmãos mais novos. Essa ocupação a distanciava ainda mais da realidade das pessoas "normais", e ela tinha medo de se tornar como a Mãe: uma pessoa fria, cheia de obrigações, sem amigos nem tempo para qualquer tipo de distração.
Os únicos momentos que a Mãe parecia feliz era quando Marcos estava por perto, e no fundo Sara sentia inclusive um certo ciúme. Será que a mãe amava mais ao Marcos do que a ela, ou aos outros irmãos?

Depois de ouvir essa teoria conspiratória, a Mãe se sentou e chorou. E choro se transformou num riso, um riso nervoso e insano. Ela então tirou uma chave que usava no pescoço como pingente e levou Sara para seu quarto. Abriu um cofre que ficava preso à parede.
Dentro desse cofre, a Mãe tirou um artefato estranho, que parecia um relógio antigo, desses de bolso. Quando abriu o visor do objeto, via-se que não era um relógio, e sim uma espécie de marcador. Uma barra onde um líquido verde viscoso mostrava que estava quase cheio.

"Marcos não nasceu aqui, como vocês. Ele é de outra época, outro tempo. Ele é um físico que trabalha num laboratório experimental. Um dia ele conseguiu uma brecha no tempo e espaço e foi assim que nos conhecemos. Marcos não é seu irmão.
Essa brecha não se mantém aberta sozinha, e por isso ele precisa voltar de tempos em tempos. Porém, o tempo que ele passa lá é percebido diferente aqui, poucos horas ou mesmo dias podem virar anos desse lado, por enquanto envelheço e vocês crescem, ele continua jovem. Ele não pode simplesmente fechar a brecha e ficar aqui, pois perderia sua conexão com a existência, sua massa não se sustentaria e ele deixaria de existir.
Em seus estudos, Marcos descobriu que a única forma de se manter aqui sem a brecha ser usada como cordão umbilical, seria ter ele uma ligação com esse lado. Esse visor mostra o quanto ele está conectado com nosso mundo. Essa conexão está sendo feita com o nascimento de cada um de vocês, vocês são a ligação que Marcos tem com esse universo e esse tempo, e assim que eu der à luz a essa última criança, o visor ficará completo, e Marcos poderá finalmente estar aqui para sempre. Marcos é seu pai." Fim.

3 comentários:

Projeto Lucas 2013 disse...

Sério q vc sonhou tudo isso?

Marcinha disse...

Serio! Gostou?

JULIANA G BORGES disse...

é uma mistura de filme com uma história bem elaborada, com mil detalhes... Que imaginação fértil!!!ADOREI!!!

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